segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Una

Uno, busca lleno de esperanzas
el camino que los sueños
prometieron a sus ansias...
Sabe que la lucha es cruel
y es mucha, pero lucha y se desangra
por la fe que lo empecina...

Uno, Discepolo.



Una

- Como tu aguenta essa cabeça efervescente? Esta loja deve ser a terapia dela...

Foi assim que Bárbara Benz, cliente do comércio em que trabalho, artista plástica talentosa, querida e delicada me fez escorregar para debaixo do balcão da loja ao largar essa para meu chefe numa faceta franco atiradora que não lhe conhecia. Bárbara Benz passou por cima de mim feito uma Mercedez Benz.

De fato entre a loja e eu há uma dialética, eu conto moedinhas (isso ajuda mesmo a focar), conto sementinhas, conto de um tudo para as velhinhas. Em contrapartida, enlouqueço bastante os outros integrantes da empresa, lhes enlouqueço os horários, as cabeças e as vistas. O pequeno banheiro vira camarim umas tres vezes ao dia, e dele saio propícia para o teatro, para o tango, para a academia, para o que der e vier. O chefe/DJ ajuda e quando me vê entrar de mala e cuia no banheiro troca a música ambiente, sempre clássica, por um tango ou algum jazz que acompanhe melhor o turbilhão que vai passar por aquele metro quadrado. As colegas já tem até um cronograma de revezamento para ver quem fica até mais tarde em meu lugar, amadas.

Sábado era a vez do tango, mas a semana já havia começado com ele. Mirian, minha professora, na tentativa de conciliar minha falta de horários e a consequente ausência nos ensaios, me delegou uma apresentação "solo", ou melhor, sola, solita nomás. Na mais absoluta inocência me sugeriu que recitasse uma poesia em homenagem a Buenos Aires. Uma uruguaya, de Paysandú, uma sanducera, recitando um tango em homenagem a Buenos Aires? A Buenos Aires que esmagou a luta de Artigas e do povo da Banda Oriental, que nos quer usurpar a nacionalidade de Gardel, que sonha em fazer alfajores melhores que os nossos? Nem respondi, só ri...

Mas chauvinismos à parte fui atrás de algum tango, argentino ou uruguaio, com espanhol acessível a lusofalantes, que pudesse expressar a nostalgia e o sentir do povo rioplatense. E não achei nada mais nostálgico e rioplatense que o cubano Ibrahim Ferrer cantando "Uno", como sempre, terminei com um cubano, fumando um habano. Minha vida seria tão mais fácil e feliz se o Uruguay fizesse fronteira com Cuba e não com a Argentina, sem contar que o que a Argentina teve de melhor, el Che, perdeu pra Cuba mesmo.

O desafio da semana foi criar uma partitura de movimentos para a declamação, recitando o trecho escolhido do tango no compasso da música mas sem cantar, descobrindo eixo nos passos que, criados para serem executados a dois num equilíbrio de corpos, seriam feitos por apenas uma pessoa, com poucas horas de ensaio. Nenhum aperto que não tenha passado no Grupo Trilho de Teatro Popular e justo na semana emocionante em que o grupo foi premiado com merecidos tres Tibicueras de Teatro Infantil e o Gremio Esportivo Ferrinho sediou a assinatura da regulamentação da Vila dos Ferroviários, conquistas importantes comemoradas pelo Trilho e pelos Ferroviários.

As escalas de terça a sexta foram casa, loja, comitê. A casa fica a cinco minutos da loja à direita e o comitê fica a cinco minutos da loja à esquerda, tudo voando claro. No bar/ comitê Latinoamericano, tive o espaço, a tranquilidade, e a beleza necessária para criar e ensaiar a participação que faria na apresentação de tango. Já era sexta-feira e eu ainda acrescentava passos, passos que comecei a aprender há um ano e mal domino, mas vamos lá, pensei em ensaiar às sete e meia da manhã do sábado da apresentação, antes de começar a trabalhar, ficaria mais segura. Roberto do comitê me olhou de um jeito que só faltou dizer: pirou cara-pálida? Mas educadamente me disse não ser possível.

No sábado às cinco da manhã eu não fazia ideia de onde estava mas percebi que dormia em casa e o celular apitava, pensei que fosse algum amigo "tarja-preta" daqueles que não tem horário para ligar ou enviar mensagens quando estão deprês. Demorei mais ainda para entender a mensagem, mas era clara como o dia: Oi Ana, podes vir às 7:30 ensaiar. Era Roberto (que deve achar que todo mundo vai dormir às cinco da manhã como ele e os outros donos de bares da cidade) na maior das boas intenções. Olhei pro espelho e quase não me vi de tão inchados e vermelhos de sono que me estavam os olhos, pensei em ensaiar toda capenga mesmo mas lembrei que havia deixado a chave do comitê em minha bolsa na loja, na loja fechada. O dono da loja deveria estar se preparando para fazer as compras na tradicional feira orgânica da José Bonifácio que abastece nossa pequena feira orgânica na Venâncio Aires. Não conseguiria nem ensaiar nem mais dormir, pensei até em fazer a feira com o chefe (programão de sábado de madrugada!) e, por sorte, antes de pensar em algo mais já havia tombado na cama novamente.

No final da tarde, depois de atravessar a loja e os clientes toda caracterizada como quem atravessa o salão pronta para bailar, fui direto à casa de Mirian que me levaria para a apresentação, e me aliviou dizendo que poderia ensaiar por uma hora ali até ela aprontar-se. Na sala espelhada de piso deslizante da professora, coloquei a música e, depois de pedir para ela não ver antes de finalizar detalhes, retomei os ensaios. Dois minutos depois de ter atendido bulhufas meus apelos, Mirian adentra a sala em lágrimas comovida com aquele tango quase cantado, quase cubano, quase acabado.

Assim que Lorena chegou, Dorgel e Mirian saíram com o carro carregado de sacolas, araras para figurinos, malas carregadas e duas uruguayas "muy malas". O caminho era longo e cheio de paradas para que, onde cabem cinco, coubessem uns dez. Antes mesmo de subirem Ariana e Takeda, Lorena e eu ensurdecemos os professores num rioplatense metralhado e alto cujas variações se resumiam ao montevideano lunfardo, carregado de gírias capitais dela e o paysano sem "esses", rasgado, quase árabe meu. O fato de termos passado em questão de minutos por todos os assuntos da vida e pelos assuntos de toda a vida dos outros pode haver contribuido consideravelmente para dar emoção à charla até nos depararmos com as caras estupefatas dos dois que não conseguiram emitir som algum perante aquela epopeia gaucha.

Já na casa de Regina para um breve aquecimento, nos organizamos em caravana para chegar ao local da apresentação junto com a chuva. Finalmente lá Fortuna nos esperava metido a anfitrião e quase o mordi quando veio me oferecendo as comidas do camarim cujas opções eram carne de vaca com alguma fritura, carne de frango com alguma outra fritura, e carne frita. Ele faria um bêbado na entrada de um dos tangos, éramos literalmente o bêbado e a equilibrista, ele agarrado em sua garrafa de 51 para adentrar no personagem e eu tentando fazer o 8 atrás sem adentrar o chão. Ana Mari e Regina protagonizaram uma cena hollywodiana quando, numa pernada dupla, fizeram voar pelos ares a bandeja do garçom que passava com as carnes e as frituras que se espalharam aos quatro ventos, qué lo tiró, qué patada...

As combinações finais e a preparação para a entrada são sempre o estopim para alguma crise, e a completa patetice do gênero antagônico conseguiu tirar Lorena do sério, eles estavam más perdidos que galleta en boca de vieja, se calentó la Lore. Crise superada começou o tango ao enunciado da própria Lorena, os tangueros ocuparam com Mirian e Dorgel mais uma pista desta cidade. Minha tarefa mais arrebatadora ali não seria a apresentação que faria só e em instantes, fui delegada como assessora de troca dos, sempre milhares, de figurinos da profe, afinal, naquele monte de malas no carro estavam todos eles. Eu cumpri minha tarefa e os figurinos também, ela estava lindona e além de dançar com Dorgel, foi acompanhada por Alfredo, argentino guapo e amigo que nos deixa no sufoco com os horários (outra vez o comércio na vida dos tangueros) mas quando chega ao salão mostra a que veio.

Nas mesas cenicamente dispostas em volta da pista, quem não dançava esperava sua vez na maior elegância. Teve tango a dos, tango a tres, tango en parejas y una milonga arrabalera. Além do público compenetrado e deslumbrado, havia o público desinteressado e mal educado, uma meia duzia de elementos que consideram a arte pano de fundo de sua vida fútil e suas conversas sobre bebidas carros e mulheres, porra, se trocar os carros por cavalos o tango fala de tudo isso, custava prestar atenção? Esperei que fossem respeitar minha apresentação baseada na palavra e na escuta, continuaram na maior algazarra, em minha frase final me dirigi até a mesa em que estavam e lhes gritei o texto, que nada... ouviram um mosquito zumbir e voltaram à festinha particular. Apesar de poluir a sonoridade tanto da declamação quanto dos tangos dançados pelo grupo, o grupelho pentelho não conseguiu tirar a emoção dos trabalhos apresentados que envolveram o restante do público que, em pé, apreciou a noite e, a convite se somou para dançar um tango final no qual mandou muito bem.

Após o término, a música tecno dominou a festa, era hora de descontrair e agora sim, cada um beber e dançar como quisesse. Foi isso que fizeram todos, Dorgel decidiu que era o astro da festa e foi para o centro requebrar, Lorena quase se descadeirou durante a Shakira, Mirian deve ter decidido que depois de dançar tão bem durante os tangos iria quebrar a rotina, deixou Dorgel boquiaberto depois de uma dancinha meio bizarra que ele não imagina de onde tenha saído. A primeira-dama do Fortuna lhe deu uma canseira, estava mais energética que Gatorade com vodka. Paola, Tô e Juliana agitaram como sempre em triângulo equilátero. Alfredo comandou as massas numa coreografia de Y.M.C.A. Alexandra é perita na civil e nas danças de salão todas. Paulo dança tango até quando toca forró.

Eu, descobri que nos vidros que enfeitavam as mesas havia alfajorzinhos uruguaios, magra com cabeça de gorda ou gorda com corpo de magra, fiquei acima de qualquer suspeita, sentada à mesa comendo um, dois, tres, quatro, cinco...alfajores. Tentei conseguir gelo para minha bebida com o garçom mas aconteceu a mesma coisa que na formatura da Fifi, eles somem, desisti da bebida e do garçom, minha relação freudiana com eles só se compara à minha relação de estrutura histérica com motoboys. O restante dos alfajores levei como cachê, ou butim de guerra se levar em consideração os elementos que não calaram a boca durante a apresentação.

Novamente na casa de Mirian para recolher algumas roupas, chamei um táxi para que andasse algumas quadras comigo até em casa. O rapaz encarregado da segurança do predio naquela noite disse ter sido bom eu ficar esperando o serviço no banquinho da entrada, que se eu esperasse na rua ele teria que ir comigo. Eu devia medir um metro a mais que ele, havia roubado alfajores na festa e apesar de bem penteada, vestida de tango, calçava um tenis enorme número quarenta, fiquei pensando o que teria levado aquele rapaz a imaginar que eu precisaria de segurança.

Na próxima apresentação quero dançar ao lado de minha amiga Angelita, outra una que faz falta.

O tango pode ser o mesmo, porque o caminho da vida será o mesmo, cheio de esperança e nostalgia intercaladas, porque unos perderam seu coração mas não há una que não tenha dado o seu.



Si yo tuviera el corazón

el corazón que di

si yo pudiera como ayer

querer sin presentir.

Si yo tuviera el corazón

el mismo que perdi.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Eles mataram a polícia


Chico Buarque no rádio, maquiagem espalhada na mesa, vinho no gargalo. Só poderia ser a preparação de um grupo de atores para entrar em cena. Nosso entrar em cena, nem sempre é um "entrar em cena", pode haver algum longo trajeto até nosso espaço de apresentação, nossos camarins já foram a rua, o sindicato, a Assembleia Legislativa, a universidade federal, uma escola, e alguns deles ficavam até em teatros. Nada anormal se fosse para um grupo de teatro de rua, o que não é nosso caso.

Desta vez nosso ponto de encontro foi um belo lugar localizado no bairro agora Farroupilha (cá entre nós, Santana). Solícito e solidário como sempre, Roberto do Comitê Latinoamericano só não abriu as portas porque eu estava com a chave há tempos, neste "bar politizado", ele já me aguentou encenando, cantando, dançando, discursando, bebendo, reclamando da bebida e a última coisa que esperava é ver duas viaturas da SUSEPE estacionar na porta do local para transportar a trupe.

Nesta ocasião seríamos as estrelas (nada daquelas algemas nem do "porta malas" nada anatômico da apresentação contra o aumento da passagem de ônibus), o Grupo Trilho de Teatro Popular apresentaria seu teatro na Penitenciária Feminina Madre Pelletier. Recebi os motoristas com um charuto aceso numa mão e uma garrafa com vinho na outra, devem ter achado que éramos um bando de artistas pequeno-burgueses loucos para começar a revolução tomando a bastilha, infelizmente somos todos assalariad@s e a maioria disponibilizou o turno em que não trabalha, meu chefe me liberou com esperanças de que finalmente não me deixassem sair do presídio...

Já na casa prisional fomos conduzid@s a um espaço bem organizado e amplo que inclusive dispunha de pequeno palco, do qual prescindimos pois nosso teatro é sempre olho no olho e nosso distanciamento é brechtiano e não espacial. Mal havíamos começado o ensaio musical e uma agente adentrou a sala trazendo o público, interrompemos e nos posicionamos para começar "A Decisão", peça didática de Bertolt Brecht, como bem anuncia Adriana no prólogo, que traz quatro agitadores soviéticos e um jovem camarada chinês em meio à visceral polêmica sobre os métodos revolucionários e a cruel contra revolução.

A expectativa do grupo para aquela apresentação, a expectativa das mulheres que nos assistiriam, nos arrebatou uma fala que outra e nos levou a algum erro cênico que não cometemos facilmente. Os olhos de Giovanna brilharam durante toda a apresentação, mas por sorte os colegas não me aprontaram o mesmo que na apresentação feita há um ano para crianças em situação de risco (leia-se expostas à pobreza e sua violência) em São Leopoldo, quando me deparei com todos chorando já na primeira cena.

A Decisão é cheia de falas conceituais e muitas delas com entendimento restrito, a uma determinada época vivida por países marcados por momentos revolucionários ou formalizado de quem é estudioso. Foi escrita para ser realizada por militantes operários na Alemanha de 30. Nosso desafio é, desde sempre, compreendê-la e apropriar-nos da capacidade do teatro de mostrar-se por vias próprias, únicas.

Depois da formalidade e contenção dos primeiros atos, as primeiras risadas, os primeiros comentários mútuos sobre as cenas que nos chegavam aos ouvidos como bruburinho e os quais cessaram quando a agente que à distância acompanhava, reprimiu com sinal de silêncio as reações espontâneas. A quietude foi total e não repreendeu somente as mulheres sob sua autoridade mas chocou a nós cuja atuação depende muito da comunicação e reação do público e nunca havíamos visto um moderador de humores em nossas obras para adultos.

A cena mais esperada por nós e que, sabíamos, mais surpreenderia as detentas, era a "4" em que o policial que reprime trabalhadores numa fábrica - personagem brilhantemente construído e encenado por Carol - é morto durante uma briga. A fala dos operários envolvidos na briga: nós matamos um policial, foi antecipado por uma das mulheres: eles mataram a polícia.

A música, componente essencial da peça, tem arranjos inspiradores nos quais Baiano e Gabriel são um espetáculo à parte com violão, bandolim, xilofone e pequenos instrumentos dos mais variados, e é durante a trilha sonora que eu abandono a agitadora contida e ponderada e evoco uma Ana sinuosa que aflora com a dança. Em meio a quebras de quadril e olhares provocadores fitei pares de olhos pintados e algumas caras bonitas que com certeza já experiemtaram - por idade ou malícia - a sensualidade muito mais que eu, mas os olhares que encontrei deixavam claro que minha sensualidade ali estava em ser livre, em fazer o que gosto, o que acredito, em não estar maculada socialmente, minha sensualidade, ali, humilhava. Terminada a apresentação em nosso habitual debate sobre a peça, uma delas pediu o violão, eu ofereci o violão e o violonista, deixei Gabriel roxo de vergonha e para trás aquela impressão de que, naquele momento, as atrizes éramos mulheres e elas apenas detentas.

Durante o debate, uma das primeiras perguntas, justamente feita pela moça que pediu o violão, foi "se nós éramos mesmo comunistas", a do lado perguntou se é muito difícil a batalha dos atores até conseguir fazer uma novela. Os graus de alienação e consciência se assemelham e reproduzem a sociedade além grades. As perguntas não pararam por aí e continuavam sobre o texto, sobre a dificuldade de sua linguagem, sobre os atores, sobre a interpretação. Ao responder um dos questionamentos Dani disse estarmos um pouco apreensivos antes da apresentação, rapidamente uma mulher interviu indagando se essa "apreensão" se devia ao fato do local ser um PRESÍDIO. Esclarecemos que nossa angústia se devia ao tempo reduzido que tivemos para ensaiar desde que a data foi marcada, cujo fator era agravado pela falta de um ator sem o qual tivemos que alterar o roteiro. Saber que faríamos nosso teatro, que é político, pedagógico, social e nossa bandeira em defesa da justiça e da alegria, para pessoas que vivem privadas de liberdade não era angústia, era diferente, era uma emoção inusitada, inédita.


A responsável pela ponte Madre Pelletier - Grupo Trilho foi Maynar, amiga, uruguaia, siamesa na forma e no signo. Maynar viu "A Decisão" pela primeira vez em temporada no Teatro de Câmara de Porto Alegre, à época gostou e comentou, Fábio gostou do comentário dela e então estavam apresentados ela e o grupo. Psicóloga estagiária sempre colocou suas teorias em prática e através dela eu já havia participado de oficina sobre Escrita no semi-aberto feminino. Na Madre conhecemos Simone, a vice- diretora com a qual projetamos a volta e Faltemara, psicóloga, futura mãe de Lorenzo, mais conhecida como FAL (Fuzil Automático Leve), não por milica e sim por perpicaz e certeira nas conotações.


Ao despedir-me lhes disse que voltaríamos, mas que bruta eu, uma delas saltou:
- Espero não estar mais quando voltarem.


terça-feira, 29 de novembro de 2011

A corrupção permanente

Foi-se o tempo em que a grande discrepância entre socialdemocracia (leia-se PT e não a direita radical do PSDB) e oposição de esquerda (leia-se a única oposição) era sua revolução por etapas contra nossa revolução permanente. A socialdemocracia brasileira acabou com qualquer possibilidade de confronto ideológico ao instaurar a corrupção permanente, sustentação nada teórica e muito prática para garantir a governabilidade.

Uma das medidas mais aplicadas pelos governos comandados pelos petistas é, em princípio, uma bandeira histórica da classe trabalhadora: EMPREGO - de todos seus agentes políticos em cargos em comissão...
Manter o apoio de uma base de sustentação a um programa que cada dia se adapta mais a ruralistas, banqueiros e máfias sindicais só poderia ser garantido com constrangimento total da crítica interna através da dependência econômica dessa base de sustentação. A lógica deduzida dessa mesma base acomodada e corrompida é: o capital acumulou tanto no Brasil que os gastos com a máquina pública são irrisórios se comparados ao lucros dos capitalistas no país. A corrupção deve entrar nessa esteira para o petismo...

A corrupção no Brasil não começou com o operário metalúrgico do ABC e sim com o príncipe regente de Portugal (que não acreditava na corrupção num só país), o que merece estudo e indignação é como ferramentas históricas das classes dominantes se tornam necessárias para a labuta de setores identificados com a classe trabalhadora que chegam a comandar o Estado.

Depois de dois mandatos que garantiram a estabilidade necessária para o maior lucro da história de muitos bancos instalados no país, a direita tradicional, a mídia e a própria Dilma estão prontos para a "faxina". A faxina é por etapas e prepara uma sujeira maior ainda, um período de tecnocracia estatal. A objetividade racionalista do lucro e da eficiência para combater a corrupção e o pragmatismo, que só podem ser combatidos com controle popular efetivo e filosfia política. As fundações públicas de direito privado são ótimo exemplo de como a corrupção faz parte do lucro, da eficiência e da técnica tanto quanto da política.

Esta manhã deveria escrever copiosamente a segunda parte da crônica sobre a apresentação de Silvio Rodriguez, sobre a história de amor que moveu aquele "concierto", mas ontem uma assessora do governo do estado que comprou no comércio em que trabalho, quis muito que eu adulterasse a nota fiscal, para poder aprovar como gasto público, um macarrãozinho do colega assessor...

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Razón de Vivir 1/2


Paula,
pequeña hermanita, niña sin jardín,
por no tener flores sembraste una en ti.
yo pudiera darte un inmenso jardín
si pudiera darte todo mi pais.

Yo sé de las cientos de suertes que corren
las flores silvestres, la flor sin jardín,
pero también sé que sequías y piedras
no pueden con una razón de vivir.

Silvio Rodríguez- Estadio Charrúa, Montevideo, 16 de noviembre de 2011

O mes de novembro foi marcado para a comunidade uruguaia residente no Rio Grande do Sul, pela visita à capital do presidente da República Oriental del Uruguay, José "Pepe" Mujica. O lutador social, ex-cativo e torturado do Estado uruguaio durante a última ditadura civil-militar, agora presidente da república, recebeu do governador do estado e do presidente da Assembleia Legislativa gaúcha, as comendas máximas destinadas por suas Casas a alguém cuja atuação social, política, humanitária é relevante.


Assim como "Lula", "El Pepe" configurará na história da America Latina como um homem que, fruto e construtor da luta social levada a cabo em seu país na segunda metade do século passado, combateu a miséria e promoveu avanços nos direitos humanos comandando o segundo governo da frente ampla que quebrou por vias eleitorais e tardiamente, o continuismo de uma política reacionária, entreguista e de arrocho estatal aplicada ora pela direita radical, ora pela direita dita nacionalista.


Estive em quase todas as atividades organizadas durante a estadia de Mujica em Porto Alegre prestigiando os discursos, as entrevistas, os debates - minhas colegas de trabalho e o dono da loja, um pequeno comércio, trabalharam em meus horários para que pudesse participar dos eventos. Ouvi atentamente Mujica e contemplei sua lucidez sobre si e sobre La Patria Gaucha, vislumbrei suas fraquezas e contradições nos discursos majoritariamente dirigidos aos capitalistas regionais, quase que pedindo desculpas por estar no poder, acalmando os investidores, prometendo taxar o grande capital especulativo e o latifúndio num possível acirramento da crise em nosso continente ao mesmo tempo que afirmava nada fazer para além dos marcos que o capital impõe ao mundo.


Durante reunião do mandatario com a comunidade intervi e lhe disse compreender que a miséria, sua fome, sua violência, vão além de consignas e conceitos, e que atender necessidades aprofundadas pelo capitalismo e causadoras da barbárie é tarefa primordial, mas que, ao ouví-lo dizer que o desenvolvimento no país era desigual também por considerável acomodação dos trabalhadores que se negam a trabalhar em áreas menos desenvolvidas, me obrigava a perguntar se as consignas e os conceitos haviam mudado tanto assim, pois a julgar pelos discursos do dia anterior e pelas linhas gerais de seu governo a mensagem era: "Frente à crise mundial, empresários de toda a América Latina: uni-vos!".


O presidente não se saiu mal na resposta, afinal, vem de uma terra de poetas... Utilizando ardiloso recurso idelógico e linguístico, me atacou como a uma acadêmica inconformada da exploração de mais-valia aprendida das teses marxistas: -- Quienes reclaman son aquellos que más tienen, los que menos tienen no reclaman, viven felizes. (?!)

Em entrevista, como componente do primeiro Conselho Consultivo de Uruguai@s em

Porto Alegre e Região Metropolitana à rádio uruguaia que cobria os compromissos da comitiva, fui observada pelo "español correcto" apesar de falar deliberadamente "en buen sanducero" com o sotaque carregado de quem nasceu em Paysandú, interior do Uruguay. Voltei a pensar sobre o aprendizado pelas vias não cultas que me garantiram grande parte da compreensão e expressão de um conteúdo.


A impossibilidade de concentração total em qualquer coisa, resultado da dispersão nata e algumas contingências me garantiram a inquietação suficiente para não aprender muito de regras, de regras que regem as frases, as pontuações - a mãe que tive me rasgou o primeiro livro didático e a cara por não conseguir aprender a separar a palavra oso, urso, o-so, antes mesmo de ir para a escola . Mas de onde viria então a paixão pelas palavras, a poesia que salva de uma realidade com a qual discordo permanentemente, e "o español correcto"?


O violão era velho e simples, o pai jovem e de voz oprimida. Os dois juntos, me acompanharam dos 4 aos 18 anos, no início sempre, depois mais raramente. Ele e o violão vinham de um bairro pobre e eu e minha mãe de uma rua bem localizada no centro da cidade do norte do Uruguay. Nunca os olhei com muita intimidade, o que é meio óbvio se pensar que foi escalado para ser meu pai quando eu já estava tirando as rodinhas da bicicleta. Eu via um homem com a pele escura, ouvia uma voz vacilante e, naquela pele, no tom da voz, atrás do violão, uma classe inteira da qual uma parcela considerável mal havia adentrado nos estudos deixando seu tempo precocemente em trabalhos pesados.Talvez eu não tenha amado aquele homem como minha compaixão infantil (ou minha arrogância) amaram aquele sofrimento que se alegrava com qualquer coisa, igualzinho aos menos favorecidos do Mujica.


As canções, estas sim eram rebeldes, afirmativas, e deixavam claro que o mundo só poderia ser digno se governado por poetas, artistas e sonhadores afins. As de Silvio Rodríguez (quase todas) eu não entendia muito e me tocavam mais que as demais, algumas dele pareciam feitas para crianças, contavam de unicórinos, de pessoinhas que faziam o bem, outras de mulheres estremecedoras e amores covardes incapazes de virar histórias, e uma era urgente para a Nicarágua. A música de Silvio tem um poder exorcista sobre o desencantamento da vida.


Não faz muito tempo que a internet tornou acessíveis vídeos, letras, imagens, e todo tipo de material sobre o trabalho do cantor da nova trova cubana, do poeta que nasceu com a revolução de 1959. Até então meu Silvio era K-7, e se no Uruguay era considerado quase um múscio nacional, no Brasil os dois chegamos ilustres desconhecidos. O congelei com a infância, com a língua mãe, com a revolução na Nicarágua.


Vinte anos mais tarde, longe de meu pai e da banda oriental e perto como nunca daquelas letras e da banda larga, retomei as músicas de Silvio, recitei muitas e dancei uma para lembrar por aqui, que nos Estados Unidos há 5 cubanos presos por defender seu país.


Vinte anos mais tarde, Silvio Rodríguez voltou ao Uruguay para cantar. E eu voltei ao Uruguay para ver o Silvio que estava por trás daquele que meu pai havia inventado para mim, daquele que eu havia dançado por aqui, recitado para José Martí.


"El Pepe" diz que o Uruguay é pequeno e os vizinhos fortes, impávidos, colossos, deixando o país numa posição tímida para aplicar qualquer política mais ousada, independente. Talvez o medo do Uruguay seja reviver um Paraguay esmagado pela política e as armas da tríplice vizinhança - dos dois colossos e do pequinês.

Quem sabe a visita do cubano relembre como se impõe respeito aos vizinhos

fortes, impávidos e colossos...



sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Siempre Adelante!



Era um dia qualquer de novembro de 2010, Angelita e eu assistíamos a uma apresentação de tango durante a Feira do Livro, bem ali no Cais do Porto, à beira do Guaíba com o sol à beira do ocaso. Ela não viu, mas uma borboleta pousou no braço do bailarino - nem ele viu -asas camufladas no paletó dançou o tango até o final e depois voou. Prestei mais atenção ao par de antenas da borboleta que ao par de pés do tanguero, mas era o primeiro tango de muitos. Seguiram, aos nossos olhos, a elegância de Anira, o estilo de Mirian e o chiclete de Lorena - esta tinha uma cara linda e um tango enxuto e firme, mas minha compulsão obssessiva não me desviava do mastigar compassado.


Não sei se é coisa de atriz ou de criança, mas não me contento em ver, gostar e ir pra casa, vejo, gosto e quero ser quando crescer. O grande problema é que além da amplitude dos quereres (que vão da carpintaria em obras à filologia) os fazeres são cumulativos e nunca excludentes...


Na passada sexta-feira 11 de novembro, há mais ou menos um ano daquela apresentação, no mesmissimo local Angelita e eu fomos assistidas por mais de uma centena de pessoas, dançando ao lado da Lorena da cara linda, do tango enxuto, firme, não mais do chiclete - minha compulsão obssessiva tem sua utilidade humanitária.


O trânsito portoalegrense, ou a falta dele nos últimos anos, paralisou todo o centro da cidade, e toda a turma da Oficina Comunitária 8 Adelante chegou como pôde, eu fui de táxi, mas não cheguei de táxi, fiz a parte final do trajeto a pé, mas o pé é 40 e o design importado.


Desta vez o grupo havia aumentado em tamanho e em dedicação em relação ao ano passado. Desde as meninas (e o menino) ainda adolescentes até a velha guarda nem tão velha assim, as coreografias, a técnica e os figurinos estavam dignos da Feira considerada a maior da America Latina, não por mercadológica e sim por qualitativa.

Contribuir com o evento vale os sacrifícios e as horas de ensaios dedicadas para mais esta apresentação gratuita do grupo - gratuita para quem requisita pois para quem trabalha em arte sem fins meramente lucrativos os gastos existem e são, não raramente, custeados pelo bolso de cada artista.


Antes do começo da apresentação, ainda no aguardo de colegas e professores que não chegavam devido ao engarrafamento, as poses para as fotos puxaram o foco não só dos fotógrafos mas do público que já se acomodava, desconheço outro grupo popular cujas aulas são comunitárias, tão metido a besta como o nosso, uma lona transparente como parede e alguns metros de compensado como piso delimitavam o espaço, mas nossa empolgação deve ter deixado até o céu em dúvida se é ou não o limite.


A apresentação já havia começado e ainda havia colegas chegando, mas nosso 8 Adelante é formado por uns 80 adelante, al medio y al fondo, dizer que as mulheres estavam em maioria já é um clichê. O caos viário, a vasta quantidade de bailarin@s, e o piso desastroso não afetaram em nada nossa hora e tanto de apresentação, o trabalho acarretado pelo grupo superou qualquer percalço. A coreografia criada pelos professores para ser bailada pelos alunos especialmente neste dia, saiu limpinha e harmonizada. A expressão do público confirmou mais uma vez a paixão que @s gaúch@s tem por esta arte que entranhou os povos rioplatenses.


Bem distribuídas as apresentações foram individuais e em grupos, coreografadas ou livres. Para emocionar mais ainda nosso professor, um tango bailado - nada mais, nada menos que - por seu filho, um guri tão lindo quanto a parceira que o acompanhou.

Mas são tantas emoções...Sempre disposta a arrasar, nossa professora Mirian inventou - nada mais, nada menos que - um modelito para cada baile. Na corrida entre uma música e outra e na falta de vestiário ou de alguma moita, corremos para atacar o primeiro estande que vimos pela feira (banheiro químico ninguém merece, entraria a profe ou o figurino nunca os dois) as responsáveis pela pequena sala foram abordadas de maneira um tanto quanto inusitada, mas mulher sabe dessas coisas e nem pergunta: Vão entrando, vão entrando.


A TVE que realmente apoia a cultura estava lá para registrar, acho que a emissora do tchurururu que faz pra você, filmaria se o esquilo do supermercado que financia a Feira (muito amigo da emissora...) dançasse um dos tangos. Espero que as câmeras tenham registrado os passos de Terezinha e sua postura axial, quase zênite.
Assim como no último aniversário do Brique da Redenção, terminamos com o mais internacional dos tangos, o público não foi poupado e também caiu aos pés de Por Una Cabeza.


Desde que foi batizada, a oficina de tango 8 Adelante cujo nome referencia um dos passos mais conhecidos desta dança, recebeu mais que um par de convites para apresentações no décimo primeiro dia de distintos meses. Depois deste 11/11/11 acho que devemos rebatizar o grupo como 11 Adelante, yo no creo pero que las hay, las hay...
Assim como já se sabe que o céu não é o limite, também se sabe que borboletas vivem bem mais que 24 horas. Mas e daí se fosse verdade, dançar um tango e voar depois, duvido que existam 24 horas tão bem vividas.


Seguiremos Adelante
Con el 8 así seguimos
Y con Daniel te decimos
Para siempre 8 Adelante!

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

O espetáculo e suas meritocracias 3/3

A sociedade do espetáculo e o Willian Waack comemoram a liberdade em Cuba.
E a liberdade de Ali Kamel e do Willian Waack em Cuba é pragmática: agora se pode novamente vender carros na ilha. Se a história chegou ao fim o mundo provou ser uma tragédia grega, oi moi, ai de mim, ai ama, que uma morte me leve - mas não por atropelamento...

Já na terra dos argonautas, um possível referendo escandalizou olimpos aos montes, tanto europeus quanto norteamericanos. Investir na democracia norteafricana deu muito trabalho às cúpulas, democracia para os filhos de Zeus seria pedir muito, provocou iras divinas. O oráculo era claro, com referendo Papandreou não retornaria com o velocino de ouro, aliás, nem retornaria.

Por aqui, no templo da Expointer dos velocinos de ouro, Tarso ou Ταρσός, critica o autoritarismo do poder financeiro privado contra o referendo grego. Visionário e conhecedor das leis que regem os simples mortais, Tarso sabe que o conservadorismo só incita a revolta, que é necessário mudar tudo para não mudar nada.

Na democracia do Tarso cujo panteão ou conselhão é majoritariamente composto por deuses e semideuses, professor deve ter como meta ser um cometa. O objetivo é manter o maior número de alunos em sala de aula, no stand up do ensino os bizarros professores de cursinho serão referência - no Brasil há escolas privadas e cursos preparatórios privados para ingressar na universidade pública (!!!). O individuo show otimizado deve substituir o investimento estrutural do Estado em educação e saúde. O futuro da administração é dos gestores privados e seus técnicos, aqueles mesmos do neoliberalismo que atende as demandas do poder financeiro privado...

O Tarso é o social democrata moderno dos sonhos de qualquer capitalista acrônico.
A trágica posição do Brasil no Índice de Desenvolvimento Humano das Nações Unidas deixou um barbudo, que não é Zeus mas é da linhagem do Tarso, irado. Mas como pode, um território onde seres humanos têm direito a carro e crédito não seria motivo para deixar o país em posição elevada??? Os programas assistenciais seriam um motivo fundamental para uma colocação melhor, talvez a equipe encarregada da avaliação seja um montão de bicho grilo que nem eu que não sabe como é difícil governar etc, e se escandalize ao saber que o Programa da Saúde da Família distribui antidepressivo tarja preta para crianças assistidas pelo programa. Achei que tivéssemos inventado essas drogas para a classe média sempre em crise existencial.

Em Cuba até abril deste ano (quando a liberdade chegou lá...) era proibido mercantilizar moradia e permanece vetado mercantilizar educação. Mas nosso destino é ser a quinta economia do cosmos e não copiar méritos anacrônicos.

A musa Maria Rita lançou recentemente um LP, não se contentou em ser ela mesma uma reedição e ressucitou também o disco de vinil.
A revolução tecnológica atual condenou precipitadamente ao leito de morte tudo que veio antes dela, e tudo foi sepultado para vir, ainda mais rapidamente, à tona com valor elevado de mercado como artigo de luxo de um passado recente para salvar-nos constantemente da nostalgia do presente perpétuo.


Achei que fossem salvar Cuba da falência para preservá-la como artigo de um passado recente, com tabaco e atos heróicos suficientes para salvar-nos da nostalgia do presente perpétuo, ou o povo grego para nunca esquecer-mos como esmagaram os troianos mas salvaram só o disco de vinil.

domingo, 23 de outubro de 2011

Negrita Santa



...mais bonita que a alvorada
que o mar azul-safira
da Republica Dominicana...

Ferreira Gullar, Cantada.



*foto Eduardo Quadros.



16 de outubro foi aniversário de Oscar Wilde, e meu também. Este ano a data passou sem a festa bienal que costumo oferecer a Wilde, aos amigos e a mim, na qual emagreço alguns quilos e mobilizo a família - seja ela qual for - correndo na preparação dos canapés, das pizzas uruguaias e outras iguarias, os convidados também correm quando sirvo chá amargo ao esquecer que o resto da humanidade usa açúcar nas bebidas.


Todo ano, com festas ou sem elas, Carol e eu temos um "presente perpétuo" que não é o conceito de Guy Debord mas sim um módico charuto Titan, um puro estadunidense, recíproco respectivamente em junho para ela e em outubro para mim.Tudo começou com Paulo Flores, ao concluirmos a escola de formação de atores da Terreira da Tribo e encenar nosso primeiro Brecht, ele disse que a tabacaria da peça sem charuto não era tabacaria, eu disse veementemente que não iria fumar charuto "em cena" pois ficaria viciada "em sério". Fui tão veemente e firme que, por fim, fumava até nos entreatos, nas coxias. Quando as duas nos demos conta já estávamos no dilema do ovo e da galinha, não sabíamos o que vinha primeiro, a peça ou o charuto. Improviso, esquete, fragmento, peça, tudo é motivo para ter baforada no meio, agora estamos inconsoláveis por não ter charuto no espetáculo infantil, crianças caretas...

Em junho deste ano, numa postura atípica, unilateralmente burlei nosso consenso não negociado e, apesar da oscilação das moedinhas na minha bolsa, mas com ajuda externa, lhe dei uma Mafalda, não era toda Mafalda, mas quase. Em meados de outubro, numa investida conservadora Caroline me espera no teatro com o velho Titan, em clara intenção de retomar os diálogos infindáveis que as duas travamos fumando o charuto. Acatei positivamente a resolução, um charuto de aniversário só não é melhor que o licor de marula que me dá no natal. Mas desta vez, ela não ficaria para fumar comigo e este seria apenas o começo de uma crise tabageira.

Depois de breve reunião para acertar táticas de promoção da peça em cartel, fui voando para a praça quase deserta em frente de casa aproveitar o resto de sol, e lá me instalei com as rapaduras de leite, o bloquinho do Bob Esponja e uma caneta por qualquer coisa.
O charuto, sequer acendeu.
Estava velho, mas não velho por diabo, mas velho por mal conservado. Por sorte, ainda tinha um toquinho em casa guardado, não era um palheiro mas um bom paliativo, deu tempo de atravessar a rua para buscar e ainda voltar à praça quando, ao longe, o sol chegava ao Guaíba. Não fumar o charuto e ter que pegar o toquinho foi um coito interrompido, frustrante. Só não fiquei mais frustrada que Caroline quando mandei mensagem contando o acontecido, nem respondeu.

Hoje, me apareceu com uma latinha. Era um dominicano, mas para adquirir um desses dominicanos a última coisa que se pode fazer é voto de pobreza. Depois de inauditos discursos sobre a péssima conservação do charuto anterior e forte pressão para reclamação junto à loja em que foi comprado, Carol confessou, havia customizado o charuto que eu havia lhe dado em junho do ano passado, que pouca vergonha. Quanta recessão...Que corte nos gastos!

A "Estética da Chinelagem" proposta ética e estética do Grupo Trilho, cuja filosofia é, grosso modo, aproveitar o que se tem, apresentar onde se pode, dizer o que se pensa, foi levada às últimas consequencias por Carol, que negligenciou meu paladar requintado para tabaco e meu olfato apurado para falcatrua.

Com um salário de babá, ela me comprou um charuto dominicano. Mas a estética da chinelagem não é invenção dela, e - diga-me com quem andas que te direi quem és - eu mesma já customizei presente também. No vigésimo aniversário, ganhei um vermouth de minha amigaCamila, ele ficou um bom tempo na escrivaninha esperando nova visita dela para ser aberto, mas um dia, eu não pude mais esperar. Depois de dois dias de fome fui até o Zaffari mais próximo e disse que havia comprado a bebida errada, quero trocar, perdi a notinha. Proveniente de algum mercado da Restinga, troquei o Martini em pleno Zaffari por arroz e feijão. Agora resta saber quem vai me processar primeiro, minha amica Camila ou os fratelli Zaffari.

Antes do pôr-do-sol, fui fumar meu dominicano. Sempre que vou para alguma praça inóspita para não atrapalhar ninguém com a fumaça, me aparece algum crioulo perguntando se é para Oxum, alguma adivinha dizendo que sou volátil como a fumaça, e até as pombas se chegam, acabo dividindo o charuto com uma horda, promovemos a "revitalização da praça".

Desta vez uma figura deu oi, alguma carente pensei...respondi um oi atravessado e dei inicio aos trabalhos. Já quase noite de sábado e eu me sentindo em pleno santo domingo, a mesma moça levanta da grama, era a vizinha (!), antes eu via só uma cabeça no meio de um monte de cachorros, agora era ela mesma. Que fora, fui lá desculpar-me, ela entendeu e disse que ficou pensando se havia dado oi para a pessoa errada. Coitada, deve ter sofrido um choque anafilático quando me viu virando a cara - eu que passo como um bobo alegre distribuindo ois para a vizinhança - e para completar acendo aquele canhão que espantei os cachorros todos.

Ela foi, e depois veio para perto um gurizinho que chamei para dar um panfleto da peça infantil, mas deve ter levado à risca o conselho dos pais de não se aproximar de estranhos, muito menos estranhos muito estranhos, deu meia volta. Por mim passaram dois adolescentes passeando com as cachorrinhas de apartameno, Polly pra cá, Polly pra lá... na idade deles eu estaria no mesmo gramado tomando vinho com minhas amigas, nós éramos hippies anacrônicas ou eles são muito bundinhas? Já no fim do charuto veio um cachorrinho manco mas muito ágil que se encantou com o aroma do charuto, este era doente do pé mas bom das fuças. Em Santo Domingo poderia estar na praia e não na praça...

As praias mais belas da República Dominicana, são propriedade privada de hotéis instalados às suas margens, "nativos" (leia-se pobres, negros ou negros pobres) precisam de autorização para pisar em suas areias. Sou uma nativa, mas de outra República, sou uma negrita, mas de pele branca, e desconfio que Santo Domingo não me queira, apesar de tudo, sou uma pobre diaba.

Carol,
...você é mais bonita que o Rio de Janeiro em maio
e quase tão bonita
quanto a revolução cubana.


segunda-feira, 17 de outubro de 2011

O espetáculo e suas meritocracias 2/3


A radioatividade pós-moderna entranhou o trabalho artístico depois de algumas décadas de disputa social, a qual contou com movimentos artísticos gerados na contracultura, orgulhosos de sua estética provocativa e escatológica, quanto movimentos - não menos ingênuos - cujas teses revolucionárias e discursos de classe foram apenas injetados em moldes e estética burgueses ou aculturados.

Por outro lado, o amadurecimento de muitos deles e o aparecimento de outros também influenciados por essas duas vertentes, capazes de abalar a arte imposta em sua forma, atribuindo-lhe conteúdo próprio, com força suficiente para burlar aparatos ideológicos e repressivos do poder e alcançar setores sociais expressivos, criaram propostas que permanecem atuais embora minoritárias


Na arte da sociedade do espetáculo, foi implementada a meritoacrobacia. O indivíduo-show da arte é um acrobata. A produção artística a ser financiada pelo capital e seus agentes públicos, exige a superação do feito artístico para resultar em imagem, mercadoria, modelo vendável.

Suas divas máximas são cantoras "teens" cujo show é um verdadeiro fenômeno à parte da música que apresentam, as trocas infindáveis de roupas durante um espetáculo, os cenários providos de mil luzes e desprovidos de sentido, e as coreografias apelativas do corpo como objeto sexual ofuscam qualquer interpretação musical seja boa ou má. Mas tais setores do mercado cujo produto não é arte e sim divertimento, são apenas hegemônicos numa pirâmide contaminada pelo espetáculo até a base.

O individuo show da arte faz stand up sobre a dificuladade de extrair pasta de dente do tubo, escreve sobre o copo de requeijão, sua realidade é a mais imediata possível, seu papel no mundo é o de consumidor, se permite uma pseudocrítica do consumismo mas é incapaz de reflexão sobre as causas dos efeitos que enumera....
As artes plásticas idealizadas pelo mercado esvaziam de conteúdo e transformam em aparência, em superposição de imagens e objetos a obra de arte, com o suposto pretexto de dessacralizá-la.

Atores desesperados em alcançar a revolução tecnológica levam à exaustão mecanismos midiáticos e corpóreos a fim de, provocar e atingir, a catarsis aristotélica atualizada: o orgasmo automático no sistema límbico e suas estruturas. 


Na dança e nas artes marciais a regra é voar, depois de treinos um tanto full time estilo ginástica, outros um tanto bélicos estilo milico.
O indivíduo show é multimídia, e sua palavra de ordem: performance.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Quando eu crescer, não quero ser adulto




Só as mães de atrizes como Giovanna Zottis e Caroline Falero podem reviver passagens marcantes e emocionantes da infância de filhas já adultas ao vivo e a cores (como na tv, hd).
E lá estavam elas, olhos rasos d'água, no final de semana de estreia de "O Baú - Lembranças e Brincanças". O sábado era das crianças no Centro Municipal de Cultura, Arte e Lazer Lupicínio Rodrigues, e elas vieram com tudo. Entre pais e filhos mais de uma centena de pessoas.

Finalmente em cena, Dindim e Pimpolha, as meninas que num sótão - lugar não comum para nossas crianças ao mesmo tempo lugar comum para o teatro - se veem afastadas dos recursos tecnológios que garantem a diversão da maioria das crianças deste país: televisão, videogame, celular, computador. Essa "privação" trata-se, como fica claro para as crianças ao final da trama, de uma tentativa da mãe de Dindim de propor um divertimento mais subjetivo, inventivo e saudável à filha.

A espontaneidade infantil de Caroline Falero e os tipos hilários apresentados por Giovanna Zottis garantem não somente criatividade e inventividade às personagens como a toda a trama que, intencionalmente, sem excessivos recursos técnicos e grandiloquentes histórias, apresenta um espetáculo tocante, cômico e que atinge seu objetivo de comunicação com as crianças resultando também imperdível para adultos.

A peça, como todos os trabalhos produzidos pelo Grupo Trilho, acaba por ser uma metáfora de como diversão, sonho, verdade, emoção, reflexão, podem ser atingidos de maneira simples sem as ciladas de um teatro baseado no exagero de elementos cênicos, recursos midiáticos excessivos e, quase sempre, com prazos comerciais.

Ao longo de quatro dias de apresentações gratuitas, sendo que, dois dias foram dedicados ao público em geral e os outros dois a escolas ou ong's previamente agendadas, a reação do público variou sempre, mas nunca na expectativa interessada dirigida à peça que conta com sensível e gostosa trilha sonora de Sergio Baiano e iluminação funcional de Bruna Immich, aliás para as crianças a melhor iluminação parece ser mesmo a falta desta nos segundos iniciais da peça, vão ao delírio.

Se sábado era dia de estreia para o grupo, domingo era dia de estreia para Enzo - dois anos e meio - que, pela primeira vez, via uma peça de teatro. Foi durante uma das brincadeiras de Dindim e Pimpolha que, desde o público, ele derreteu a mim e aos pais: tô loco pra ir lá!
Se os pais que acompanham os filhos se divertem e sorriem praticamente todo o tempo, é quando Pimpolha reclama: "...os adultos ficam o dia inteiro trabalhando sem dar atenção às crianças e quando dão ficam bravos..." que as crianças se matam de rir dos pais, que desta vez, ficam sérios, ui, meus calos...

Na hora da música mais conhecida das crianças, Borboletinha, o coro é espontâneo, uníssono, meigo!
As campeãs de risos são, claro, as piadas que falam do pum que escapou, do chulé da princesa, rsrsrs. Os aspectos fisiológicos tão moralizados pela sociedade vigente acabam por ser objeto de descarga coletiva quando exorcizados, no caso dos adultos é o sexo, mas o chulé e o pum também fazem sucesso.

A orientação de Fábio Castilhos, numa perspectiva de direção participativa, deu objetivo à sequência das inúmeras narrativas, estados de ânimo e brincadeiras colocadas em cena durante 55 minutos.
Em apenas quatro dias de apresentação "O Baú" já coleciona ótimas críticas, inclusive do pessoal encarregado da faxina do teatro: vocês deixam tudo organizado, que bom trabalhar assim.

Para provar que somos crianças grandes e tão presos à tecnologia quanto as crianças que retratamos, após o espetáculo protagonizamos uma cena e tanto no café do teatro. Foto para cá e foto para lá, Laerte resolve enviar por bluetooh um dos registros para o celular de Giovanna, mas a foto não chega nunca, ao que vem alguém lá da outra mesa: são vocês em meu celular! O homem que havia aceitado a foto acreditando ser de seu irmão (também Laerte!) veio logo desfazer o engano.
Ver e fazer "O Baú" é propôr um divertimento mais subjetivo, inventivo e saudável para crianças e crianças que viraram adultos.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

O espetáculo e suas meritocracias - 1/3

A bomba atômica fragmentou os corpos de Nagasaki e o pensamento de Fukuyama.

Para o fim da história, os processos históricos acabaram, mas nesta sociedade do espetáculo tudo é considerado momento histórico a ser eternizado pela imagem, inclusive os momentos históricos. Teria se transformado o presente perpétuo de Guy Debord numa constante oferta de momentos históricos instantâneos, audiovisualizados, publicizados, twittados? Será a a pós-modernidade um supermercado de pseudoacontecimentos pré-prontos, para serem aquecidos em 5 minutos por macro e micro ondas eletromagnéticas? Serão as geleiras da Patagônia, as torres de Manhattan e as pirâmides do Cairo margem de erro do pensamento pós-moderno?             

 A musa de qualquer capitalista ou burocrata é a massa. Na sociedade capitalista em sua fase atual, a massa de 7 mil  megapixels  traz no DNA o sistema, mas a massificação em escala mundial criou um tipo standard de indivíduo, o indivíduo-show, que como toda criatura pode, está longe disso mas pode, rebelar-se contra seu criador.

individuo-show tenta fugir desesperadamente da condição de massa a que é relegado cotidianamente, otimiza seu potencial físico, psíquico, interpessoal/virtual tornando-se apto para o mercado de consumo e eficiente para o mercado de trabalho, isentando responsabilidades sociais do Estado sobre ele ao mesmo tempo que aumentam as responsabilidades policiais do Estado sobre ele -pessoas podem perder a guarda de filhos obesos acusados de negligência, mesmo estes sendo expostos sistematicamente ao arsenal propagandístico de exaltação da gordura sintética.

Esse SHOW MAN é instrumentalizado pelo avanço cientifico inaugurado pelo FAT MAN, dispositivos técnicos e tecnológicos que, em certo grau, suprimem a divisão gearcional a que foi submetido no campo psicológico - ele deve ser eterno enquanto compre. Avanço que, diferente da história de Fukuyama, não terá fim e deveria estar a serviço de um sistema justo no qual a autonomia do ser humano fosse um acréscimo à toda a sociedade e garantia de seu bem estar - transgenia poderia significar um avanço humanitário se não fosse propriedade intelectual privatizada usada para entupir o mundo de soja.

Eu como saudáveis alimentos orgânicos (não obstruo as artérias nem os corredores do SUS), faço exercícios regulares (numa academia que me queima as calorias e um bom dinheiro também), leio revistas atualizantes sobre psicologia, nutrição, neurociências (ainda não posso pagar um personal psico, um personal diet, um personal nerd), mal consigo ler um livro inteiro devido à hiperatividade, e o mais importante, os momentos de ócio, improdutivos, inoperantes, são uma culpa digna de qualquer ensaio nietzscheniano. Para completar, deveria requisitar crédito para comprar um imóvel...
Eu sou a comunista pós-moderna dos sonhos de qualquer capitalista pós-moderno.

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Por Una Cabeza


Dividindo a sombra da árvore, Ariana e eu ríamos do jornalismo pós-moderno, no qual jornalistas - majoritariamente os televisivos - não mais observam o fato, analisam, criticam, comunicam, eles são o próprio fato. De dietas heróicas até desafios abissais no último dos penhascos, todo experimento é válido no desespero de prender a atenção de um público cada vez mais multifacetado e internauta.

Eis que, por ironia do destino, nós, que iríamos registrar com olhar interessado a apresentação de tango em motivo da revitalização do Brique da Redenção, faríamos parte do evento! Mas aí é diferente, nossa curta mas constante trajetória na recém batizada, porém remota Oficina Comunitária de Tango Ocho Adelante dirigida pelo professor Daniel Carlos, só poderia enriquecer qualquer narrativa, torná-la de fato orgânica, uma perspectiva única que também tem seus contras, pois perdemos o absoluto. Vou tentar ser uma pequena parte (apesar dos 1,80cm) no qual está contido o DNA do todo - pretensiosa...

Como não poderia ser diferente cheguei ao Monumento Expedicionário voando as tranças, lá havia sido montado palco para um dia de apresentações pela revitalização do Brique e os dez minutos de atraso em dia de apresentação pesam como horas - todo atrasado sonha na véspera do grande dia que vai se atrasar e, no dia, se atrasa. E como minha cara de desespero deveria estar na proporção do meu atraso, mal cheguei ao local e já havia uma moça do público com cara de seta me indicando a localização dos tangueros. Descobri que havia chegado tarde para o horário marcado mas cedo para horário em que o pessoal começa a chegar...no Brasil o horário marcado tem "licença poética", o tango seria de BA (Buenos Aires) e a pontualidade da BA (Bahia).
Todas as mulheres havíamos feito altas combinações, chegamos à conclusão de que a roupa seria social e preta, fizemos quase um pacto de sangue...Estava uma mais vermelha que a outra, sobre o social podemos dizer que é um termo muito genérico. Todas ajeitando flor no cabelo, falando da largura do palco, da largura do vestido, da largura do vazio do universo, tangueras, pecaminosas e os homens ali, tangueros, impecáveis.

Antes da apresentação, um pequeno ensaio no chão batido, lá se foi meu lustre de Nugget, a poeira da Redenção acostumada aos capoeiristas, levantou perante un ocho adelante, una mordidita, una cadencia, un ganchito. Do palco, nossa prof. esplendorosa chamava, era hora de formar parejas...minha conterrânea rioplatense no grupo vai entender: un lío, em baiano: um auê. Era homem com duas mulheres, parceiro que chegaria mas não chegava, de repente, brotaram de uma só vez todos os homens que faltavam e, direto da Montevideo do início do século 20, irrompe o som de La Cumparsita, hino do tango, composição do uruguaio Gerardo Matos Rodriguez, ao qual abriram a apresentação Eduardo e Cintia com seu tango bem feitinho, simples e sincero como a gente rioplatense.

Depois da Cumparsita lá fomos nós, cinco parejas no melhor estilo arrabal - lotando o espaço com mais alegria que coreografia, mas uma alegria ensaiadinha. Depois, mais cinco. Ao sol, o público, uma brisa setembrina amenizava, o início de tarde de domingo estava para o tango quase antídoto, quase alegre. Mas a tarde não passaria impune, Mirian e Dorgel em coreografias ousadas imprimiriam o tom melancólico que faltava ao domingo, dançaram mais uma obra prima dos que nasceram ao oriente do rio Uruguay, a milonga Violín de Becho del maestro Alfredo Zitarrosa.

Voltamos ao palco depois de mais uma troca de parejas - leia-se troca de parejas as mulheres fazendo dos homens cabos de guerra cada uma querendo dançar mais que a outra pois àquela altura já éramos maioria como sempre. Receptivo e simpático o público, que já havia entoado aplausos no meio de nossa primeira apresentação, foi mais uma vez enfático e generoso em nossa terceira passagem pelo palco. Uma milonga bem bailada pelo argentino Lepera e sua parceira fechou a sequência de apresentações individuais.
Para finalizar, e desta vez pude observar absolutamente tudo desde o público, se deu a mais bonita das cenas que nosso parque e nossa feira merecem, ali, onde há menos de uma semana marcharam passos rígidos em honrarias militares que tanto envergonham a história remota e recente do Brasil, Uruguay e Argentina, tanguearam no palco e entre o público dezenas de parejas ao som de Por una Cabeza, música de Gardel outro uruguaio, com letra de seu parceiro o brasileiro Alfredo Le Pera , uma honraria ao maior dos feitos, a integração de nossas culturas.

Conosco dançaram Anira que nos brindou com sua elegância junto ao colombiano e ótimo tanguero Pedro, depois do tango, seguiu a perfeita salsa cubana de Arnel Hechavarria e sua parceira Aline.
Parabéns a Daniel, nosso professor argentino do qual claramente aproveitamos a ausência para tocar tantos tangos uruguaios...e a toda a turma da Oficina de Tango, unida, alto astral e solícita como sempre! *2011